5/23/2008

Ninguém disse que seria tão difícil.
Ele a encontrou apressada, seus olhos fixos no relógio, praguejando os minutos desperdiçados em esperar, enquanto seus pés tamborilavam o chão em um ritmo descontínuo, metropolitano.
Guiou as mãos à frente, em um gesto tímido, mais para garantir confiança à certeza do seu ato falho do que aguardando a reciprocidade. Contentou-se com um aperto de mão. Como nos velhos tempos, lembrou a si mesmo.
Ela evitou as formalidades, tanto por meio das palavras quanto através dos gestos. Só queria que tudo acabasse logo. Usava óculos para esconder seus olhos vermelhos. Eram lágrimas então que insistiam em cair.
Olhou mais uma vez para o relógio, sua impaciência demonstrada nos pequenos gestos. Era o seu horário de almoço, e ela se preparava para argumentar isso no momento em que ele apressou-se em entregar-lhe uma chave. A chave do apartamento.
Ninguém disse que seria fácil, mas nunca disseram também que seria tão difícil. E ela sentiu isso quando a recebeu, mesmo sem querer olhar diretamente em seus olhos, sabia que ele a buscava, que necessitava de respostas que só ela poderia dar - se as tivesse.
Ele já não precisava da chave, passara a manhã empacotando suas lembranças enquanto o caminhão aguardava-o lá fora. Estava então de volta ao começo, após andar tanto tempo em círculos.
Seus pais concordaram em hospedá-lo enquanto procurasse um novo lugar. Abriu mão do apartamento, do carro na garagem e do futuro que sonharam juntos. Mas não poderia nunca se desfazer das memórias. Não queria.
Eram cartas, fotografias e gente que foi embora, tudo reunido em uma caixa que passou indiferente aos empacotadores. Tinha uma foto dela também, mesmo que lhe custasse a aceitar.
E uma lista. Com alguns nomes de garotas. Enquanto casado, ele se perguntava porque ainda a guardava, o fato de tê-la não significava exatamente que precisava dela para lembrar de todos os rostos, abraços e momentos que passou com cada uma delas. Mas significava muito mais do que gostava de explicar.
No dia do seu casamento pensou em jogá-la fora, mas a tinha desde os 11 anos, após seu primeiro beijo no jardim do colégio que estudou a vida inteira. Essa foi a razão de não ter amassado-a - tinha lembranças demais nela.
E agora mesmo, após entregar a chave, viu-a partir como tantas fizeram - e prometeram não fazer. Sem se despedir, ele retira do bolso esse papel já amarelado e anota o nome da mulher que mais uma vez achou ser a garota da sua vida.
Todos os nomes partiram sem se despedir. Partiram um coração, partiram sem razão. Partiram sem necessidade de predicado. O que ficou procurava por respostas, porém nunca chegou a saber quais eram as perguntas que lhe guiava, enquanto as via andar para longe e olhar uma última vez em sua direção, como ela agora o fazia - porém dessa vez diretamente nos olhos.
E todas as vezes ele pensou que fora o fim do mundo, que sentira uma dor que ninguém nunca antes havia sentido e o drama cegava-o a ponto de pensar em desistir pra sempre de si.
Mas sempre se recuperou. Levantou a cabeça e mais de uma vez voltou à luta, confundiu a lágrima com o sangue e com o suor. Mais de uma vez matou o seu orgulho e confundiu-se com a vontade de não ser.
Essa que agora entrou no carro se tornou mais um nome e mais uma esperança que se mostrou falha. Ele escreve seu nome na lista pra demonstrar a si mesmo que ele dará a volta por cima como sempre fez.
Mas ele precisava entregar a chave, precisava abandonar o que construíram juntos para poder recomeçar. E ele precisava murmurar adeus de longe, mesmo sabendo que ela não iria ouvir, quer pela distância quer pela má vontade. Ninguém disse que seria fácil.

Um comentário:

Anônimo disse...

(( L ))